Retrospectiva 2015
O que acontece no Brasil e no mundo em relação a LGBT

44 personagens LGBT passaram pela TV no Brasil em 2015

Safra no ano foi positiva de forma geral e marcada pela diversidade arco-íris

Publicado em 29/12/2015

Personagens LGBT, gays, lésbicas e transexuais que passaram pela TV brasileira em 2015 em séries e novelas

Por Marcio Claesen

Em época de TV digital, TV por demanda, Smart TV e 4K, não é a tecnologia só que nos chamou atenção em 2015. Falemos do quanto o arco-íris LGBT ocupou as telas da TV no Brasil e, pelo bem ou pelo mal, fizeram história. 

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Ao todo, contabilizamos 44 personagens LGBT fixos que integraram novelas, séries e minisséries produzidas no País e veiculadas em canais abertos ou fechados este ano. Dentre exemplos positivos, negativos e neutros, obrigatório notar a diversidade LGBT presente, os debates sobre sentimentos e cidadania, e um conservadorismo, mesmo alvejado, ainda em movimento. 

PONTOS ALTOS

Os Experientes
A série da O2 Filmes sobre a terceira idade foi ao ar em horário ruim na Globo (sextas à noite), mas apresentou-se como um deleite de delicadeza e profundidade. O último dos quatro episódios mostrou a descoberta de Francisca (Selma Egrei), que perde o marido após 45 anos de união e percebe que ele não era quem pensava ser. A mulher, então, permite-se envolver-se com a vizinha Maria Helena (Joana Fomm) com direito a tapa na cara da sociedade (os amigos hipócritas) e beijo na boca.

Joana Fomm e Selma Egrei em 'Os Experientes'
Joana Fomm e Selma Egrei em 'Os Experientes'

Pé na Cova
A inclusão continuou presente na quarta temporada da série de Miguel Falabella, recheada de situações insólitas e bizarras. Os personagens, repletos de contradições (como todos nós), emocionam. Em que outro lugar da Globo você ouviria "Tem muita bicha que dá bom marido" ou "Sapatão é como lagartixa, regenera muito rápido" e abriria uma gargalhada sem culpa?

Romance Policial - Espinosa
Protagonizada por Domingos Montagner, a série do GNT trouxe em uma trama paralela o envolvimento do policial Otávio (Paulo Verlings) com a transexual Débora (a atriz transgênero Carol Marra). Eles se conhecem por meio de um aplicativo e ele descobre a identidade de gênero dela apenas no primeiro encontro. Ele fica surpreso, mas pelo beijo na sequência (apontado pelo canal como o primeiro de uma transexual na TV) deixa claro que isso não importa e eles se envolvem.

Carol Marra e Paulo Verlings em Romance Policial - Espinosa
Carol Marra e Paulo Verlings em 'Romance Policial - Espinosa'

Mulheres São de Marte e É pra Lá que Eu Vou
A série, que gira em torno de Fernanda (Mônica Martelli) ganhou segunda temporada no GNT e um casal gay. Na trama, o melhor amigo de Fernanda, Aníbal (Luís Salém) é casado com Edgar (Gustavo Machado). Aníbal precisa lidar com a ausência do marido, que é viciado em trabalho, e com a mãe do bebê que o casal adotou, e que resolve pedir a guarda da criança.

Felizes para Sempre
Outra produção da O2, a minissérie veiculada pela Globo foi muito além do perfeito bumbum de Paolla Oliveira em uma cena que ganhou repercussão nacional. Sua personagem, a prostituta de luxo Danny Bond, se apaixona por Marília (Maria Fernanda Cândido) após um convite para apimentar o casamento infeliz que Marília vive com o marido. As cenas de intimidade entre as duas foram delicadas e ardentes ao mesmo tempo.


PONTOS MÉDIOS

Vizinhos
A tocante série de Luiz Villaça que foi ao ar no GNT dividia-se entre as agruras de um casal de meia idade sofrendo da síndrome do ninho vazio (quando os filhos crescem e vão viver suas vidas) e seus inquilinos, uma república de jovens por volta dos 20 anos. Dentre eles está Eduardo (Bernando Bibancos), um cowboy do litoral deslumbrado com São Paulo e que se revela michê. Dos programas com mulheres para os homens e é um pulo e sua faceta bissexual se expõe. Uma pena que já se tratava do final da temporada e a questão não foi aprofundada.

Império
Em seus últimos meses no ar, no início de 2015, a trama de Aguinaldo Silva colocou nos trilhos a paixão de Leonardo (Klebber Toledo), que perigou "se tornar" hétero na trama e Cláudio (José Mayer), o que deu coesão à relação dos dois, com direito a um paupérrimo selinho. Já Xana (Aílton Graça) se perdeu. A personagem que começou como travesti, virou crossdresser e em certa hora era nítido que o próprio ator não entendia mais a confusão que o autor escrevia. A bicha má Téo (Paulo Betti) dividiu opiniões. Entretanto, não passou de uma caricatura.

José Mayer e Klebber Toledo: casal gay em Império
Cláudio (José Mayer) e Leonardo (Klebber Toledo) em 'Império'

Alto Astral
Esta trama das sete poderia ser resumida em dois personagens: Samantha (Cláudia Raia) e Pepito (Conrado Caputto). A falsa paranormal e seu fiel escudeiro foram os responsáveis pelos melhores momentos da novela de Daniel Ortiz. Os trejeitos do peruano compuseram o personagem de forma que ele ficou deliciosamente crível. Nas útlimas semanas, Pepito se dividia entre ajudar a chefe em seus planos e marcar encontros por aplicativos.

Sete Vidas
É digno de nota colocar Regina Duarte, a eterna 'namoradinha do Brasil' e atriz tão amada pelas mulheres maduras e senhorinhas, em um personagem que amava outra mulher. Mas na novela de Lícia Manzo, Esther tinha apenas um passado lésbico. Viúva da esposa desde sua primeira aparição na trama, a personagem acaba se envolvendo com um ex-namorado vivido por Jonas Bloch. Mas a trama reservou um final gay para Eriberto (Fabio Herford), que após se separar da mulher se declara ao amigo Renan (Fernando Eiras).

Verdades Secretas
Walcyr Carrasco ousou em temas e situações em sua novela das onze, que bateu recorde em personagens LGBT no ano - sete! Destaca-se as bem exploradas bissexualidade de Anthony (Reynaldo Gianecchini) e Sam (Felipe de Carolis). Tateou nesta esfera também Bruno (João Vitor Silva) e Stephanie (Yasmin Brunet), que no último capítulo dá um belo beijo em Mayra (Rhaissa Batista), relação que ficou na superfície. A afetação do estilista Maurice (Fernando Eiras, novamente) é elogiável, diferente da de Visky (Rainer Cadete), que ficou um tom acima a trama inteira perdendo uma bela oportunidade de mostrar as nuances de seu booker.

Felipe de Carolis e João Vitor Silva: romance gay em Verdades Secretas
Sam (Felipe de Carolis) e Bruno (João Vitor Silva) em 'Verdades Secretas'

Tapas & Beijos
A travesti Stephanie (Rafael Primot) nunca convenceu muito. Na quinta e última temporada da série, a personagem, que mais parecia um cross-dresser, teve pouco destaque a respeito de seu romance com Tijolo (Orã Figueiredo).

I Love Paraisópolis
Na trama paulistana, o mordomo Júnior (Frank Menezes) foi lembrado durante meses de seu passado como a transformista Juneca Purpurina. Em certo ponto, ele mesmo revive a drag queen. Mas, na reta final, em vez de encontrar um homem para chamar de seu, Júnior se envolve com a cozinheira Urbana (Maria Paula Lima), para descrédito de todos, sem explicação plausível. Muito melhor foi o final de Expedito (José Dumont) e Claudinei (Iuri Krushewsky). De tanto se passar por Claudineia, o garçom mulherengo termina na boleia do caminhão do ex-sogro vestido de noiva em um final transgênero à la Quanto Mais Quente Melhor.

José Dumont e Iuri Kruschewsky: casal transgênero em 'I Love Paraisópolis'
José Dumont e Iuri Kruschewsky em 'I Love Paraisópolis'

Totalmente Demais
Na atual novela das sete há dois personagens declaradíssimos (preferimos este termo a 'assumidíssimos'). Pietro (Marat Descartes) é a bicha fina e Max (Pablo Sanábio), o gay repleto de bordões divertidos. O folhetim merece elogios por mostrar que ambos são bem sucedidos e valorizados pelos poderosos protagonistas dos quais são braço direito. Ao mesmo tempo, pelo menos por enquanto, nenhum dos dois tem história própria em relação a seus interesses românticos.

Vai que Cola
Ferdinando fez tanto sucesso que ganhou um talk show só seu (Ferdinando Show), algo incomum já que é comandado pelo personagem e não pelo ator. Em meio a gritaria do elenco de Vai que Cola, o porteiro gay da pensão divide-se entre seu sonho de estrelar um musical da Broadway, fazer citações a Barbra Streisand e paquerar o boy magia Máicol (Emiliano D'Ávila).

A Regra do Jogo
Comum nas tramas de João Emanuel Carneiro, o acabamento dado aos personagens LGBT costuma ser bastante duvidoso resvalando em 'cura gay'. Aqui, ao menos por enquanto, o autor não chegou a tanto. O casal Úrsula (Júlia Rabello) e Duda (Giselle Batista) chamou atenção em determinado ponto da trama ao pensar em processo de inseminação artificial. Duda acabou engravidando do cunhado, mas seu interesse foi estritamente biológico. Um possível romance entre eles, especulado pela imprensa, não existiu. 

Julia Rabello e Giselle Andrade fazem casal lésbico em 'A Regra do Jogo'
(Úrsula) Júlia Rabello e Duda (Giselle Andrade) em 'A Regra do Jogo'

PONTOS BAIXOS

Odeio Segundas
A série de Fernanda Young e Alexandre Machado, no GNT, é boa. Com texto e elenco afiadíssimos, a derrapada é justamente com o segmento arco-íris. Casada com mulher, a lésbica Brenda (Carol Machado), apesar de carregar alguns estereótipos, começou bem mas foi se deixando levar pela paixão/atração do colega de trabalho, Lipe (Flávio Pardal). A relação entre eles careceu de coerência, já que a personagem é o que podemos chamar de uma 'lésbica convicta'.

Acredita na Peruca
Nada se salva nessa sitcom do Multishow feita para mostrar o talento de Luiz Fernando Guimarães. Com texto pobre e encenação lenta, o show de horrores incluía o mordomo Sebastian (Eucir de Souza), que tentava esconder sua relação com o misto de pedreiro e go-go boy Carlão (João Gabriel Vasconcelos, em shortinhos deliciosamente curtos), além da drag queen cabeleireira Lucy in the Sky (Beto Carramanhos).

O elenco de 'Acredita na Peruca', série repleta de personagens LGBT e gays no Multishow
Elenco de 'Acredita na Peruca', no salão de beleza onde se passava a história

Babilônia
Por fim, a decepção do ano. Escrita por três gays, Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga, a novela das nove começou como um orgasmo múltiplo para o orgulho gay: um beijo caloroso entre duas das maiores atrizes do país, Fernanda Montenegro e Nathália Timberg. O que veio depois, todos já sabem. Boicote de evangélicos e conservadores em geral e debate nacional sobre o tema. Com outros problemas críticos na trama, que ajudaram a audiência a cair, os autores se acovardaram. Tiraram qualquer carinho dentre as octogenárias, inclusive, no próprio casamento delas. Quem em sã consciência se casaria sem trocar um beijo? (Oops, o ator Paulo Gustavo!).

E podia ficar pior. Para contentar a audiência feminina, que bateu seus saltinhos no chão e disse preferir ver Marcos Pasquim como hétero, os autores mudaram a história de seu personagem, Carlos Alberto, e ele não se mostrou gay - ainda que alguns indícios já estavam sendo dados. Ivan (Marcello Melo Jr.), com quem Carlos Alberto teria um romance, ganhou outro par romântico, Sérgio (Cláudio Lins). A entrada do personagem transexual Úrsula (Rogéria) foi atrasada em mais de 60 capítulos e pouco acrescentou à trama. 

O único ponto a favor: a homofobia escancarada foi toda colocada na boca de Consuelo (Arlete Salles), uma evangélica hipócrita, e ajudou a ridicularizar a personagem, que se tornou a melhor da novela.

As lésbicas de Fernanda Montenegro e Nathália Timberg em 'Babilônia'
Estela (Nathália Timberg) e Teresa (Fernanda Montenegro) em 'Babilônia'

 


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