'Hoje Eu Quero Voltar Sozinho' é filme solar sobre jovem que vive na escuridão

Publicado em 08/04/2014

Marcio Claesen

O cinema já tratou de deficiências físicas e minorias sexuais inúmeras vezes - algumas de forma memorável, outras involuntariamente risível. Unir os dois temas faz um diretor correr ainda mais riscos. Para nossa sorte, Daniel Ribeiro entra no primeiro grupo com seu longa de estreia Hoje Eu Quero Voltar Sozinho.

O filme nasceu como um curta, que comoveu plateias em festivais pelo mundo e já foi visto mais de 3 milhões de vezes no YouTube. Eu Não Quero Voltar Sozinho (2010) mostra em 17 minutos o carinho que nasce entre dois garotos - um recém-chegado à escola e um cego - e a frustração de uma amiga do segundo por sua paixão não correspondida.

A história coesa parecia destinar qualquer coisa que se tentasse desenvolver sobre o roteiro a uma porção de floreios que deixaria claro que o essencial já foi contado. No entanto, Daniel conseguiu sair dessa armadilha.

O longa conta com o mesmo trio de protagonistas, um pouco mais velhos, mas na faixa etária em que se tateia o mundo. Leo (Ghilherme Lobo) se divide entre o colégio e os banhos de sol na casa da melhor amiga Giovana (Tess Amorim). A rotina é quebrada com a chegada de Gabriel (Fabio Audi), novo aluno que se torna próximo do rapaz a fim de realizar um trabalho escolar. Tudo isso muda o foco de sua vida.

Com a intenção de aprofundar o universo de Leo, o diretor criou um conflito com seus pais. Agora, o jovem se sente oprimido em casa e o cuidado de ambos com sua cegueira lhe parece excessivo, o que o faz pensar em sair de casa, num intercâmbio.  

A despeito das interpretações muito marcadas de Eucir de Souza e Lucia Romano (que interpretam seus pais), o embróglio no lar dá densidade ao personagem e, ao mesmo tempo, corrobora com a intenção de Ribeiro de contar a história de um adolescente que tem dúvidas e problemas como qualquer outro.

Leo enfrenta as brincadeiras maldosas por não enxergar, mas também está descobrindo sua sexualidade e vive a fase típica adolescente de contestação da opinião dos pais. Seus pensamentos estão conturbados, mas as cenas são leves, ao som de Belle & Sebastian. Sua visão não existe, mas as imagens são solares. 

Um dos trunfos do longa, aliás, é não recorrer a clichês. Não são necessários quaisquer recursos audiovisuais além da própria história para entendermos como o rapaz vê o mundo. Entra aqui outra qualidade, a interpretação de Ghilherme Lobo. O ator entrega o mesmo compromentimento do curta que deu início ao projeto e sustenta inúmeros momentos sublimes.

Nem Ghilherme nem Daniel tiveram compaixão pelo personagem. Leo e todas as suas incertezas, deficiências e características são tratados de forma justa onde só grandes filmes, como esse, conseguem chegar. 


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